25 de agosto de 2009

SALVAÇÃO E CURA PARA A VIDA


Caio Fábio d' Araújo Filho

“Cura-me, Senhor, e serei curado; salva-me, e serei salvo; porque tu és o meu louvor”. (Jr 17:14)
Salvação é a tradução do verbo grego sozo e do substantivo soterio (de onde vem o termo teológico soteriologia), e quer dizer: cura, paz, segurança, socorro, perfeição, prosperidade, maturidade, proteção, saúde, bem estar, libertação etc.
A linguagem de salvação e a linguagem de cura estão intimamente entrelaçadas ao longo de toda a Bíblia. Das 151 vezes em que são usadas as palavras gregas que designam salvação, dezesseis referem-se à libertação de doença ou de possessão demoníaca, e mais de quarenta à libertação da morte física. No Novo Testamento, a salvação é concebida como uma espécie de cura última. É essa cura que torna possível a integralidade centrada no Espírito.
Por isso é que quando Jesus curava, dizia: “A tua fé de salvou”. Quando Ele perdoava pecados, também usava a mesma declaração: “A tua fé te salvou”. E Mateus 8:17 nos diz que Ele fazia assim a fim de que se cumprisse a Escritura: Ele levou sobre as nossas dores e as nossas enfermidades”, citando Isaías 53. De fato Isaías 53 não é uma descrição da crucificação, mas sim da vida redentora de Jesus. Toda ela.
O que não se entendeu ainda é que a Cruz é anterior à crucificação. Na realidade a Cruz vem antes de tudo, pois o Cordeiro foi imolado antes da fundação do mundo. A criação, especialmente em sua forma “consciente” – a dos humanos –, é a própria história da Cruz. Ele tomou sobre nossas dores antes delas existirem. E Ele as fez Dele antes delas existirem para nós. Por isso a vida de Jesus é a vida na Cruz.
A encarnação inicia o processo histórico no qual a crucificação foi apenas o cenário de um fato que, em Jesus, aconteceu o tempo todo. Jesus viveu na Cruz, por isso é que morreu nela. Esse é o poder de Sua ressurreição. Também esse é o poder que Lhe deu autoridadepara abrir o Livro e lhe desatar os sete selos” – conforme Apocalipse 5. Quem abre o Livro é um Cordeiro, “como havia sido morto”.
Ora, o que isto tem a ver com cura e salvação? Ele levou sobre Si as nossas dores, enfermidades, iniqüidades, transgressões, descasos, preferências pela morte, e nossas falsas impressões, visto que “olhamo-Lo, e nenhuma beleza havia Nele que nos agradasse”.
Antes de curar um paralítico Ele disse: “Estão perdoados os teus pecados”. Como os fariseus e seus cúmplices se revoltassem, Ele indagou: O que é mais fácil? Dizer estão perdoados os teus pecados? Ou dizer: Levanta-te, toma o teu leito e anda? Ora, para que saibais que o Filho do Homem tem autoridade para perdoar pecados – então disse ao paralítico: “A ti te digo: Levanta-te, toma o teu leito, e vai para tua casa. E levantou-se e, tomando logo o leito, saiu em presença de todos...” (Mc 2:1-11).
Para Jesus toda cura sinalizava a salvação, pois a salvação era a verdadeira cura. Ora, assim como a Cruz foi a vida de Jesus, assim também os benefícios dela crescem na existência daquele que crê. Só que é um processo: Ele viveu a Cruz até a crucificação. Eu venho da Cruz-crucificação e caminho salvo para ser curado no resto do caminho, até o mergulho final, quando esse corpo de morte será absorvido pela Vida Eterna.
As implicações disso são inúmeras. Aliás, tudo o que se tem para falar aos humanos tem a ver com esse processo. O Evangelho é o chamado para essa viagem de cura, na Graça de Deus.
Estou afirmando isto porque as pessoas pensam que salvação é apenas um levantar de mãos que supostamente sinaliza o fato de nós “aceitarmos a Jesus”. Ora, isso não tem nada a ver com ter levantado a mão, mas com ter crido em Jesus e aberto o coração à ação do Espírito Santo.
Quem aceita Jesus ainda está colocando algo em sua vida, dando permissão para alguma coisa entrar em sua existência. A questão é que a salvação implica no caminho oposto. Ela vem de eu entrar na Vida de um Outro: Aquele que por mim morreu e ressuscitou. Isto é estar “em Cristo”.
Você pergunta: E que diferença isso faz? Ora, faz toda a diferença. A começar do fato que somos salvos da idéia de uma salvação estática e paralisante. É essa salvação estática aquilo que gera o mal dessa presunção que hoje nos acomete. Somos os salvos mais doentes da Terra! Somos os salvos em quem não é possível enxergar salvação, mas no máximo “declarações de salvação”.
Pela Graça eu sou e estou salvo para sempre. Se salvação também significa segurança, então em Jesus eu estou seguro para sempre. Mas é pela mesma Graça que eu caminho na direção de minha Total Salvação. E esse processo termina quando nasce o homem conforme a imagem de Cristo, o varão perfeito, o homem refeito em Deus. Dessa forma, eu fico sabendo que a salvação que eu recebi em Cristo Jesus não me indica um caminho de “santidades que adoecem”, e nem de “salvações que enfermem a alma”.
Qualquer coisa – não importa travestida de que nome “santo” ela apareça – que faça adoecer, não faz parte da salvação. Quando alguém diz que está se santificando, mas a gente vê que a pessoa está menos sadia do antes de começar a se “santificar”, pode-se saber que aquilo ali não é santificação, pois não carrega uma salvação para o ser, mas apenas o engana com algo que não se realiza como bem para ele.
Portanto, qualquer prática cristã que enferme a alma não é salvação, mesmo que seja praticada em nome dela. Somos salvos para sermos sarados, não para ficarmos neuróticos e adoecidos de alma, pelos medos, culpas, fobias, e terrores que nos assolam todos os dias, mesmo enquanto arrogantemente nos dizemos salvos.
“A tua fé te salvou. Vai-te em Paz!”
(Lc 7:50) – dizia Ele também. A verdadeira salvação faz a gente entrar na paz. Daí em diante acabam-se todos os medos em relação a Deus, e inicia-se o caminho da pacificação da alma – de onde vêm a nossa cura progressiva. Quando se tem essa consciência até as enfermidades físicas carregam um poder terapêutico. Depois disso, tudo cura. Até aquilo que dói.
O alvo do Evangelho é gerar seres humanos cada vez mais sadios de alma e espírito. E essa é uma realidade que só nos acontece quando estamos na paz. Daí para frente a jornada é toda ela terapêutica. Mas não há cura enquanto pender sobre nós a culpa do pecado. Por isso, antes de tudo, Ele disse ao paralítico: “Estão perdoados os teus pecados”. Ninguém é curado enquanto existe como culpado. E aqui não falo de receber uma cura para os ossos, ou para a pele, etc. Estou falando de cura para o ser, para a alma.
Ninguém cresce no caminho da cura enquanto caminha na neurose e na fobia do pecado. Somente depois que fico sabendo e creio que Ele já levou sobre Si todas as minhas transgressões, é que começo a andar no caminho que me levará à paz. Afinal, o castigo que nos trás a paz estava sobre Ele, por isso é que pelas Suas pisaduras nós somos sarados. Aleluia!
Assim, a grande questão da vida já não é o pecado, mas a vida. Quem vive de pensar, ver e falar do pecado é aquele que ainda está profundamente doente. Interessante isso. Nos Evangelhos quem mais fala de pecado é a Religião que se encontrava adoecida pelo legalismo, ritualismo e hipocrisia de seus líderes, não Jesus.
Jesus fala em pecado em duas perspectivas:
1. Como denúncia: interessantemente tais discursos se dirigem aos que só falavam em pecado – o dos outros: os fariseus e os religiosos.
2. Como uma realidade sobre a qual Ele trás Graça: e também é interessante que aqueles aos quais Ele disse “estão perdoados os teus pecados” são justamente aqueles acerca dos quais a religião dizia: "Este é pecador”, referindo-se às prostitutas, publicanos, paralíticos e enfermos de todos os tipos.
A religião fala de pecado. Jesus fala de perdão de pecados. E fala de pecado àqueles que denunciam o pecado, sem enxergarem que quanto mais falam no assunto, mais doentes em sua presunção de não serem pecadores eles se tornavam. Desse modo, a questão do perdão dos pecados é a primeira a ser resolvida – e para sempre –, a fim de que se possa crescer no dom da salvação como saúde humana. Eu vim para que tenham vida, e a tenham em abundância” – disse Ele.
Se a compreensão em fé acerca do Evangelho não nos levar até aí, ficaremos falando de pecado a vida toda, e nos agarrando nervosa e neuroticamente à salvação, mas sem jamais usufruirmos de seu primeiro bem, que é a paz com Deus e a experimentar a paz de Deus que excede todo o entendimento; e sem jamais podermos crescer em sua promessa, que é a vida abundante, começando aqui na Terra.

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